Quando a empresa que fazemos é a empresa que somos
31 de outubro de 2007
Num desses ensolarados dias desta primavera, estava reunido com alguns Especialistas, participando da construção do projeto progressista Engrenagem, que é liderado pelo Télio Bicalho. Um projeto que tem por objetivo melhorar as entregas dos softwares que produzimos. Debatíamos sobre os clientes, suas necessidades e desejos, os objetivos almejados, a forma e conteúdo dos treinamentos, sua carga horária e distribuição de agenda, dentre outras peculiaridades do Engrenagem.
Os trabalhos, que já vinham sendo conduzidos com serenidade e responsabilidade, estavam na reta final e minha participação ali, era meramente coadjuvar no desenvolvimento da “alma” daquela equipe, sendo o facilitador entre as várias inteligências ali disponíveis.
Lá pelas tantas da reunião, regada com muita troca de experiências e aprendizado em equipe, entre jugular e planta de serviço, indicadores e necessidades, um Especialista conclui algo como: “eu não tinha me dado conta do que faço, da importância do que faço. O que faço é muito mais do que simplesmente dar treinamento, repassar informações e conhecimento.”
Na hora pensei “Ora, ora, ora. Agora que você se deu conta disso?” E continuamos a resenhar sobre o quanto, por meio de nosso trabalho, podemos viver nossos valores mais profundos, que mais nos realizam, como cooperação, respeito e solidariedade. Outro Especialista, que parecia já ter habilitado esse valor, discursou com o brilho nos olhos que tem os vencedores, sobre o quanto é gratificante ver sua inteligência, lógica, sua marca pessoal enfim, transformada numa aplicação que atendia e solucionava a vida de vários alunos e, que só seu deu conta disso, quando viu ao vivo a operação da Newton Paiva.
E, olhando mais para o horizonte, ampliando nossa perspectiva, o quanto para um país que anseia por educação, é importante o trabalho que realizamos. O quanto, para uma sociedade onde imperam diferencias sociais, o acesso ao conhecimento pode ajudar pessoas a conquistar uma vida mais humana e justa. E nós estamos inseridos nesse holograma de mercado, fazemos parte disso, sim.
Finda a reunião, restou-me um sentimento de que ali, naquela conclusão a que chegou o Especialista, naquele significado criado, estivessem questionamentos e sentimentos comuns, por vezes não declarados, deixando um vazio entre o que fazemos e o que queremos ser. Essa questão me rondou o pensamento por todo final de semana.
“Quais as diferenças entre uma empresa progressista, que tem no ativo humano sua maior riqueza e que estamos trabalhando para nos tornar, da firma econômica, cujo modelo ultrapassado de gestão, escraviza inteligências e forja desconfiança entre seus membros?” Continuei a me questionar.
As diferenças são inúmeras, certamente, e convido-os a refletir sobre estas nos próximos dias. Porém, na empresa progressista, a primeira (e para mim a mais importante) a se alinhar, precisa ser declarada pelo dono da empresa, seu principal dirigente ou por seus principais líderes: os interesses.
As Firmas Econômicas da Era Industrial, possuíam interesses egoístas e, que por serem egoístas obviamente não eram declarados. Como reunir pessoas para dar seu melhor em torno de um objetivo que não é comum? Certamente ninguém apoiaria uma “causa” medíocre, onde o empresário trabalha apenas pelo lucro e o “empregado” apenas pelo salário, soldo atribuído pelas horas que troca de sua vida. Não por acaso o pensamento “minha alma deixo na guarita antes da entrada do trabalho. Daqui pra frente, só meu corpo é que entra.” é a tônica de muitas empresas pelo mundo afora. Na Firma Econômica, trabalho e vida são imiscíveis, não se misturam porque não combinam, são excludentes. Ou um, ou outro e ponto final.
O desenvolvimento tecnológico que vivemos, citado como o mais importante marco da virada do milênio, está encobrindo uma revolução silenciosa que vem se instalando nas empresas. Na era do conhecimento, as pessoas precisam se tornar mais independentes e cooperar em equipe, serem auto-confiantes, determinadas e auto-motivadas, orientadas por um caráter irrefutável, fatores que determinam a verdadeira vantagem competitiva no mundo corporativo.
Segundo uma pesquisa do Instituto de Ciência e Tecnologia de Manchester, os executivos brasileiros são os mais insatisfeitos em todo o mundo com o trabalho. Sintomas de esgotamento, dores de estômago, insônia, ansiedade, insegurança e irritação são os fatores físicos e psicológicos mais diagnosticados e que estão prejudicando o desempenho profissional, assim como as relações familiares. Seria o nosso tão aclamado “jeitinho brasileiro”, ora travestido de conformação com o desrespeito, ora travestido em “ninguém vai ver, faz assim mesmo”, que começa a dar seus primeiros sinais físicos e psicológicos em nossas corporações? Onde não há verdade e propósito, é patológico que as pessoas adoeçam da alma.
O século XXI aponta a importância da construção da qualidade de vida, que não virá de graça: decorrerá da capacidade de reconhecer a verdade sobre nós mesmos, nossos valores que geram a energia da vida, compreender quem somos e o que queremos ser, como lidamos com os desafios da vida, como lidamos com os outros, como nos relacionamos com o mundo, como reagimos às perdas e frustrações e, especialmente, como lidamos com o que consideramos sucesso.
A conclusão que o Especialista chegou, tão óbvia hoje em minha cabeça, me fez refletir novamente sobre o que, para mim, é sucesso e sobre os interesses que nos faz viver a CADSOFT. Por que para mim, vida e trabalho se confundem de forma tão espontânea? Estaria eu e os demais líderes, presumindo de forma errada que os interesses e objetivos estejam claros a todos?
• O que fazemos?
• Como fazemos?
• Porque fazemos?
• Pra quem fazemos?
E são sobre os interesses e objetivos que convido-os a refletir em busca de nossa causa comum. Interesses declarados, compartilhados e conquistados por todos. Para que vida e trabalho sejam mais gostosos e compensadores de se viver, como o poeta que enxerga no simples atravessar de uma rua, a estrofe que faltava à sua grande obra. Quando a empresa que fazemos é a empresa que somos.
Texto de Glauson Mendes